Depois de ler o artigo sobre Meyerhold, apressei-me a vir escrever-me e escrever-vos.
Durante muitos anos fiz dança e sentia o vibrar do meu corpo a cada pirueta, a cada salto, a cada movimento mais ou menos brusco que encontrava a música e se unia a ela numa fusão sempre simbiótica. Às vezes, ainda hoje, no recanto do meu abrigo, o corpo não resiste ao impulso e danço ao som da música e dos passos técnicos ainda recordados.
Mas no teatro não é assim. A escola que tenho é mais intrínseca e menos clownesca. O movimento que sempre segui foi o do sentimento que vinha de dentro e que fazia o público esquecer que era um actor que existia no palco, mas que se lhe assemelhasse pela empatia do sentir. O teatro pelo corpo do actor, faz-me sentir menos real e mais "ginásta". A verdade, é que, me parece quase incorrecto, porque logo me interrogo: e o sentir? Não pareceremos pitorescos demais?
Mesmo nos ensaios, surge-me uma castração natural ao actor pelo corpo, pois o exagero implicado no personagem, parece-me irreal e distante do objectivo pelo qual temos lutado até agora. E, na verdade, não consinto em levar o personagem ao limite, pois eu própria impus um limite preconcebido e preconceituoso ao personagem e à forma como deixo que molde o meu corpo.
Penso que na nossa forma de interpretar os nossos personagens sempre nos debatemos com uma luta entre o Id e o Superego, entre o que sentíamos querer expor do personagem e o limite do verosímel para o público. Na escola de Meyerhold surge o oposto, surge um Id autêntico, sem pudores nem gentilezas. Se me é dificil olhar as coisas desta perspectiva? Sim. Porquê? Porque sinto falta da técnica, do apoio que me permita libertar o corpo e a mente, expondo o ridiculo e o exagero contra o qual sempre lutei. Porque não temos trabalhado o corpo dessa forma, porque preciso de tempo e de treino.
É preciso deixar o corpo fluir...e o texto também...
Esta será uma nova aprendizagem, nova luta, novo fazer e refazer, um novo e grande desafio. Falta soltar as amarras que entorpecem o corpo e começar a usá-lo, a conhecê-lo e acima de tudo... a trabalhá-lo.
Sónia Ferreira
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